Não é a toa que
dizem que o frio nos desperta para algumas reflexões, alguns
pensamentos que ficam nas paredes de nosso cérebro vem a tona, e com
essas reflexões, se aproxima junto algumas atitudes das quais não
estamos muito acostumados a ver, senão motivados.
O dia propriamente
dito foi de sábado agora, mais precisamente dia vinte de julho de
dois mil e treze, data em que estamos em um curso de Doutorado em
Direito.
Eram mais ou menos
cinco e quarenta da manhã quando acordei, olhei pela janela e vi que
não havia ainda clareado, coisa que é costume em nosso país natal,
mas que pelo sul do continente sulista da América Latina, isso não
acontece.
Aqui costuma a
amanhecer por volta de umas oito e meia da manhã nessa época, e
escurece lá pelas cinco e vinte mais ou menos.
Com quase uma
semana de curso, todos falavam do frio que estava assolando a cidade
de Buenos Aires, mas que para meu padrão de conforto ambiental, não
era nada tão diferente assim da capital Paulista, coisa de seus
vinte e dois graus, mas com a agravante de que vinha do sul, um vento
polar.
Esse vento polar
tomava conta das ruas da capital Argentina, mas não me afetava,
simplesmente brincava com os colegas de sala que eu pagaria para ver
o frio Argentino.
Com toucas,
cachecóis, luvas, calças por baixo, as colegas que vieram de mais
ao norte do país, já estavam se queixando da geleira que estava
fazendo, mas como falei, nada que um bom chocolate quente, ou um chá
não retirasse aquela sensação de inverno.
Costumamos a
brincar com principalmente as colegas mulheres, se elas estariam
preparadas para ir para o polo Sul, pois lá sim, o frio seria de
matar.
Ríamos,
brincávamos mas não nos dávamos conta de que uma frente fria
chegaria em pouco tempo, trazendo com ela o famoso Vento Polar, e
isso iria fazer a grande diferença entre um pequenino frio, e um
verdadeiro frio, da qual estávamos apostando que não iríamos
encarar.
Pois bem, o frio
foi chegando aos poucos na cidade, e num piscar de olhos ele já
estava invadindo nossa pele, veio para ficar.
E não só para
ficar, com diz o mineiro, mas para se instalar com toda a força, e
esse “trem” gelado, não teria para onde ir porque esse “trem”
não pega a “coisa”, essa “coisa” que passeia entre as
estações.
Para não ficar
preso no apartamento, fomos dar um passeio na cidade no sábado e não
tinha como ficar alheio as condições sociais de um país rico
culturalmente, e pobre socialmente.
É um contraste
gigantesco esse país que com uma economia à beira da falência, com
uma inflação enorme, políticos corruptos, e as mães da praça de
Maio clamando por justiça, vive numa arrogância enorme,
principalmente com um país que está alimentando seus compatriotas,
pois se não é o dinheiro brasileiro o povo já estaria mendigando,
mas essa soberba não lhes desce ao solo.
Foi um passeio até
que bonito, ver a Casa Rosada, palácio presidencial, local dos
Ministros, mesas de Madeira Brasileira, fotos de muitos personagens
políticos locais e estrangeiros também, colocados em verdadeiro
destaque nas paredes desse palácio.
Depois dessa
visita, um caminhar na cidade com o vento frio, chamado de Vento
Polar, entrava nos pulmões de nós que não estamos acostumados,
começamos a reparar um pouco mais no povo.
Esse povo, que vive
nas ruas, que não tem onde morar, como em qualquer lugar do mundo,
vivem nas calçadas, com pequenos barracos de papelão, deitados a um
solo gélido e um único e pequeno cobertor para cobrir-lhes ora as
pernas, ora o rosto.
Numa destas
casinhas de papelão, podia se ouvir o choro de uma criança, um bebê
de seus três ou quatro semanas, uma mulher de seios de fora para dar
leite a essa criança e um pai ao lado daqueles dois pobre coitados.
Não parecia uma
família completamente desinformada, apenas a sorte não lhes
proporcionara uma condição social diferente, ou que havia lhes dado
uma rasteira retirando seus pertences, seus bens materiais, e mais do
que isso, sua dignidade.
Como em qualquer
lugar do mundo, ao se comparar pessoas nessas condições, vamos ver
as mesmas histórias, as mesmas versões para o que para elas a vida
lhes ensinou, ou tenta lhes ensinar.
São pessoas comum,
sem privacidade de um banho, sem privacidade de um banheiro, sem a
privacidade de um quarto, sem a privacidade de um colchão, sem a
privacidade de uma roupa decente.
Um pensamento me
passou na cabeça, onde andaria a mente dessas pessoas, porque lá,
no local onde estavam, não havia pensamento algum, senão de
sobreviver por mais um dia.
Sei de que passamos
por histórias parecidíssimas, onde os indigitados moradores vivem
uma história exatamente igual, só mudando o número na calçada por
onde fazem seus barracos, mas a reflexão da qual falei veio como um
carro de fórmula um em plena reta, rasgando a tudo e deixando um
grande vácuo no que vem atrás.
Muitas pessoas
morrem nesse período, muitas pessoas adoecem nesse tempo de frio, e
o que nós fazemos por essas pessoas se elas mesmos não querem sair
do local onde estão?
Parece-me uma
questão ao olhar para nós, agasalhados, com roupas apropriadas para
o frio até mais intenso, e esse pessoal literalmente com sua pele
para protegê-lo do frio.
Não gostaria aqui
deixar de escrever por não saber o que colocar no papel, mas
faltam-me palavras para combater a uma amostra tão visível para
todos.
Sigo meu estudo,
cada vez mais desejo estudar, tentar compreender o que se passa com a
humanidade cujo crime que põe uma pessoa atras das grades é falta
de pagamento de uma pensão alimentar, ou então por maltratar um
animal.
E esses pobres
mortais, será que estão abaixo de um animal, ao receber tantos maus
tratos, tanta indiferença política.
Por essa e por
outras é que não posso hoje vos dizer – Prazer em Recebê-los,
mas sim, um Desprazer em Escrever.
(Clóvis Cortez de
Almeida)
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