Páginas

segunda-feira, 22 de julho de 2013

E quanto o frio chega



Não é a toa que dizem que o frio nos desperta para algumas reflexões, alguns pensamentos que ficam nas paredes de nosso cérebro vem a tona, e com essas reflexões, se aproxima junto algumas atitudes das quais não estamos muito acostumados a ver, senão motivados.
O dia propriamente dito foi de sábado agora, mais precisamente dia vinte de julho de dois mil e treze, data em que estamos em um curso de Doutorado em Direito.
Eram mais ou menos cinco e quarenta da manhã quando acordei, olhei pela janela e vi que não havia ainda clareado, coisa que é costume em nosso país natal, mas que pelo sul do continente sulista da América Latina, isso não acontece.
Aqui costuma a amanhecer por volta de umas oito e meia da manhã nessa época, e escurece lá pelas cinco e vinte mais ou menos.
Com quase uma semana de curso, todos falavam do frio que estava assolando a cidade de Buenos Aires, mas que para meu padrão de conforto ambiental, não era nada tão diferente assim da capital Paulista, coisa de seus vinte e dois graus, mas com a agravante de que vinha do sul, um vento polar.
Esse vento polar tomava conta das ruas da capital Argentina, mas não me afetava, simplesmente brincava com os colegas de sala que eu pagaria para ver o frio Argentino.
Com toucas, cachecóis, luvas, calças por baixo, as colegas que vieram de mais ao norte do país, já estavam se queixando da geleira que estava fazendo, mas como falei, nada que um bom chocolate quente, ou um chá não retirasse aquela sensação de inverno.
Costumamos a brincar com principalmente as colegas mulheres, se elas estariam preparadas para ir para o polo Sul, pois lá sim, o frio seria de matar.
Ríamos, brincávamos mas não nos dávamos conta de que uma frente fria chegaria em pouco tempo, trazendo com ela o famoso Vento Polar, e isso iria fazer a grande diferença entre um pequenino frio, e um verdadeiro frio, da qual estávamos apostando que não iríamos encarar.
Pois bem, o frio foi chegando aos poucos na cidade, e num piscar de olhos ele já estava invadindo nossa pele, veio para ficar.
E não só para ficar, com diz o mineiro, mas para se instalar com toda a força, e esse “trem” gelado, não teria para onde ir porque esse “trem” não pega a “coisa”, essa “coisa” que passeia entre as estações.
Para não ficar preso no apartamento, fomos dar um passeio na cidade no sábado e não tinha como ficar alheio as condições sociais de um país rico culturalmente, e pobre socialmente.
É um contraste gigantesco esse país que com uma economia à beira da falência, com uma inflação enorme, políticos corruptos, e as mães da praça de Maio clamando por justiça, vive numa arrogância enorme, principalmente com um país que está alimentando seus compatriotas, pois se não é o dinheiro brasileiro o povo já estaria mendigando, mas essa soberba não lhes desce ao solo.
Foi um passeio até que bonito, ver a Casa Rosada, palácio presidencial, local dos Ministros, mesas de Madeira Brasileira, fotos de muitos personagens políticos locais e estrangeiros também, colocados em verdadeiro destaque nas paredes desse palácio.
Depois dessa visita, um caminhar na cidade com o vento frio, chamado de Vento Polar, entrava nos pulmões de nós que não estamos acostumados, começamos a reparar um pouco mais no povo.
Esse povo, que vive nas ruas, que não tem onde morar, como em qualquer lugar do mundo, vivem nas calçadas, com pequenos barracos de papelão, deitados a um solo gélido e um único e pequeno cobertor para cobrir-lhes ora as pernas, ora o rosto.
Numa destas casinhas de papelão, podia se ouvir o choro de uma criança, um bebê de seus três ou quatro semanas, uma mulher de seios de fora para dar leite a essa criança e um pai ao lado daqueles dois pobre coitados.
Não parecia uma família completamente desinformada, apenas a sorte não lhes proporcionara uma condição social diferente, ou que havia lhes dado uma rasteira retirando seus pertences, seus bens materiais, e mais do que isso, sua dignidade.
Como em qualquer lugar do mundo, ao se comparar pessoas nessas condições, vamos ver as mesmas histórias, as mesmas versões para o que para elas a vida lhes ensinou, ou tenta lhes ensinar.
São pessoas comum, sem privacidade de um banho, sem privacidade de um banheiro, sem a privacidade de um quarto, sem a privacidade de um colchão, sem a privacidade de uma roupa decente.
Um pensamento me passou na cabeça, onde andaria a mente dessas pessoas, porque lá, no local onde estavam, não havia pensamento algum, senão de sobreviver por mais um dia.
Sei de que passamos por histórias parecidíssimas, onde os indigitados moradores vivem uma história exatamente igual, só mudando o número na calçada por onde fazem seus barracos, mas a reflexão da qual falei veio como um carro de fórmula um em plena reta, rasgando a tudo e deixando um grande vácuo no que vem atrás.
Muitas pessoas morrem nesse período, muitas pessoas adoecem nesse tempo de frio, e o que nós fazemos por essas pessoas se elas mesmos não querem sair do local onde estão?
Parece-me uma questão ao olhar para nós, agasalhados, com roupas apropriadas para o frio até mais intenso, e esse pessoal literalmente com sua pele para protegê-lo do frio.
Não gostaria aqui deixar de escrever por não saber o que colocar no papel, mas faltam-me palavras para combater a uma amostra tão visível para todos.
Sigo meu estudo, cada vez mais desejo estudar, tentar compreender o que se passa com a humanidade cujo crime que põe uma pessoa atras das grades é falta de pagamento de uma pensão alimentar, ou então por maltratar um animal.
E esses pobres mortais, será que estão abaixo de um animal, ao receber tantos maus tratos, tanta indiferença política.
Por essa e por outras é que não posso hoje vos dizer – Prazer em Recebê-los, mas sim, um Desprazer em Escrever.
(Clóvis Cortez de Almeida)

Nenhum comentário:

Postar um comentário