Fui me dando
conta de que julho está chegando ao fim e com ele o meu curso de
Doutorado já está na metade, e as consequências de que minha
estadia com minha mãe também está terminando na cidade de Buenos
Aires.
É um período
tão pequeno, mas tão curto que quando vamos nos dar conta do fato,
o período de quinze dias já está finalizando e com ele temos que
começar a arrumar nossas malas.
Antes de
colocarmos nossas camisas, nossas calças dobradas e guardadas,
precisamos arrumar para que nenhum vínculo fique pregado nas peças
de roupas, ou que nenhuma lembrança ruim possa abarrotar nossa
bagagem como nos quer nossos pensamentos inimigos.
Toda viagem tem
um começo e esse se deu quando em casa comentei que estava
embarcando para o país vizinho, só, sem muita bagagem, sem alguém
para falar ou para trocar ideia.
Seria uma
quinzena de total silêncio, onde quem mais gritaria seria minha
consciência, que por certo estaria falando alto, sem muita censura,
ou até mesmo sem uma única censura.
Ao comentar em
casa, minha mãe esboçou uma forte vontade de vir comigo, para
companhia, para ficar apenas dentro de um quarto de vinte e cinco
metros quadrados, com apenas uma televisão que fala em Espanhol, e o
silêncio de tudo que podemos chamar de sociedade, apenas pelo prazer
de me fazer acompanhado por um membro da família, que desta vez não
poderia ser minha esposa.
Compramos a
passagem, e embarcamos, eu rumo a mais um módulo de meu curso, e ela
para mais um período de reclusão, já que sua visão não mais
ajuda a caminhar com facilidade só, pelas ruas de uma cidade até
então desconhecida.
Também, devido
a um pequeno problema auditivo, ao retirar os aparelhos que a mantém
ligada ao nosso mundo pelos sons, fica ela alheia de tudo, até mesmo
de um grito dado, ou de alguém que lhe dirija a palavra, mesmo que
em tom bastante forte, alto o suficiente para balançar as estruturas
do apartamento.
O importante é
que chegamos ao local, e assim começamos nossa jornada não só de
estudo mas para mim também uma jornada extra de esforço, em que
meus medos, meus receios motivados ao meu coma, não podem se
manifestar, principalmente para que ela se sinta segura ao meu lado.
Estava
comentando com ela mesmo a respeito do que é uma síndrome do
Pânico, e explicando o meu esforço duplo para me manter firme, na
trilha, sem deixar o carro escapar, para que ela possa estar
confiante no motorista, e ela com sua sabedoria, me levantava o
astral, me colocava para cima, não deixando a manifestação deste
medo que me acompanha desde que saí do meu coma.
Palavras de
muita sabedoria de uma mulher que mede um metro e cinquenta e oito
centímetros, mas que se agiganta ao falar, e de muita força para
quem precisa se apoiar a alguém para andar nessas horríveis
calçadas Portenhas.
E agora,
defronte minha mala, começo colocando minha calça, mas além de
minha calça coloco também na bagagem um alívio por ter vencido, um
desafogo por ter conseguido conduzir minha mãe na capital Argentina.
É como se o
esforço fosse compensado, ao olhar para trás e ver aquele menino
apavorado, e agora com rosto aliviado, com a sensação de dever
cumprido, e seu diploma, não de Doutorado, mas seu diploma da vida
lhe fosse entregue, sem mácula, completamente atualizado, sem mesmo
tendo seus caracteres esmaecidos pelo tempo.
Foram metade de
um mês que passou sem que me desse conta da tamanha responsabilidade
que assumi, e agora que tudo já passou, que meus desafios finais
estão restritos a pegar um táxi e dirigir-me ao Aeroporto, fazer o
embarque para São Paulo, meus ombros se tornaram uma tonelada mais
leve.
Assim, vendo
esse breve período, com olhos de apenas um observador, venci, e essa
vitória está relacionado diretamente à fortaleza que se chama Mãe.
Meus
agradecimentos ao meu Pai, que permitiu ficar na ausência de sua
esposa para acompanhar-me nessa viagem, a minhas irmãs, que também
como eu, frágeis também necessitam da presença dessa mulher e
tiveram o altruísmo de destituir-lhe dos afazeres para que pudesse
ficar comigo, também meu muito obrigado.
Meu muito
obrigado, minha Mãe, pela disponibilidade de estar com seu filho
mais velho de idade, mas que nesses quinze dias se tornou mais um
garotinho em suas mãos.
Assim sendo,
Prazer em Recebê-los, Prazer em Tê-la comigo minha Mãe.
(Clóvis Cortez
de Almeida)